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domingo, 4 de julho de 2010

II - O Desaparecimento de Dana.

Na realidade seria difícil definir como tudo começou, pois fatos decisivos acontecem a todo instante, seja na Era Medieval(1000d.m.) ou mesmo no Presente(2100d.m.).Mas se formos considerar o que desencadeou todos os acontecimentos mais recentes nas vidas daqueles jovens e de todos que os cercavam como ponto de partida, então seria necessário voltar muitos anos no tempo para iniciar algum entendimento. Mais precisamente para o ano 1000d.m., a época de Kolt de Atlântis em que Rackel Casanova nem ao menos pensava em nascer. Teoricamente seria impossível ver ambos frente a frente, pelo menos até aquele dia...
Certa manhã, Kolt acordou sentindo-se muito mal. Estava com tonturas e dores por todo o corpo. Isso era muito raro de acontecer, pois mesmo em seus piores dias apenas uma simples gripe era o máximo que costumava afligi-lo. Era um menino com um corpo forte e sadio, mas naquela manhã mal conseguia ficar de pé. Nem de perto parecia ser o mesmo menino que vivia esmurrando as árvores e os monstros por simples diversão. Ao contrário dos dias normais, Kolt foi o último a acordar e na cama de palha permaneceu procurando deslocar-se o mínimo possível. Tal cena podia ser considerada como assustadora ou até milagrosa, mas pelo menos para Dana aquele tremendo mal-estar tinha uma explicação muito simples:
_Com certeza foram os monstros que tu vives comendo! _dizia ela. _Tu sabes que eles são criaturas das trevas, não sabes? Decerto pegaste uma bela de uma indigestão! Sempre digo para não come-los, mas nunca me escutas!!!
_Mas eles nunca me fizeram mal!
O menino estava deitado numa cama de palha em sua casa na árvore enquanto Dana o bombardeava de broncas e advertências. Sentada ao seu lado, a doce menina apalpava seu rosto para sentir a sua temperatura e estranhou o calor da pele combinado com o suor frio. Tinha certeza que tratava-se de um mal do outro mundo, pois de outro modo não seria capaz de derrubar Kolt daquela maneira. Decerto seria um mal causado pelo tenebroso sangue dos monstros, criaturas que Dana repudiava com todas as suas forças. Seu negativismo extremo já fora comprovado milhares de outras vezes quando eles assassinavam e destruíam tudo o que viam pelo caminho e agora ela sabia que até a sua carne era amaldiçoada. Mesmo mortos e assados, os monstros ainda podiam destruir vidas.
Dana estava ao seu lado cuidando e o ajudando sempre. Com apenas dez anos era uma perfeita "dona de casa" que adorava se sentir útil. Solidária e obediente, jamais fazia malcriações graças ao seu coração limpo e inocente. Era tão amável que, mesmo quando cometia uma falta grave, era praticamente impossível repreende-la perante ao seu olhar cativante. No entanto era muito medrosa e detestava ficar sozinha. Não seria surpresa para Kolt se ela desmaiasse após levar um pequeno susto. Por isso vivia colada no irmão gêmeo que cumpria bem suas obrigações, mas que nem sempre gostava que lhe fizessem companhia.
Kolt não era má pessoa e retribuía com carinho a dedicação da irmã cuidando e protegendo ela. Mas ele era mais inquieto, daqueles que não conseguem sentar-se nem por um minuto. Vivia procurando alguma coisa para fazer, mas desde que exigisse de muita força e agilidade para ser executada. Era tão forte que podia derrubar uma árvore só usando a força dos braços. Vivia sonhando com um mundo de aventuras, combates e peregrinações nas quais ele sempre saía como vitorioso. Como todos os bons meninos da época, também sonhava em ser um cavaleiro de Hurânia e defender os fracos e oprimidos. Era um desejo tão grande que vivia treinando lutas de espadas contra uns bonecos de madeira feitos por ele mesmo. Costumava amarra-los em um galho qualquer e os espancava a tarde inteira com um pedaço de bambu. A ilha já estava repleta de árvores quebradas e galhos jogados pelo chão, afinal ele vivia quebrando tudo. Fazia isso para ficar bem forte, pois assim poderia ir até o Reino Sagrado de Hurânia para ser escolhido como cavaleiro. Mas tanta dedicação lhe deixava com tanta fome que os peixes do lago e os legumes da horta já não estavam dando conta do recado. Foi aí que ele começou a caçar os monstros para assa-los e come-los, pois assim achou que iria recuperar a energia que estava lhe faltando. Só que Dana não gostou da idéia e decidiu não come-los também. Talvez por isso Kolt ficara doente e Dana jamais se sentira tão bem.
Mas a menina sabia como ajuda-lo. Tinha um grande conhecimento sobre ervas medicinais que somente a vida pôde lhe ensinar, além de uma floresta cheia delas. Dana nunca chegou a conhecer alguém que ingeriu carne de monstro e passou mal em seguida, mas ela tinha certeza de que conhecia uma poção que iria curar o teimoso Kolt. Só precisaria buscar na floresta os ingredientes necessários, além de providenciar a refeição matinal para ambos. A menina morria de medo de sair sozinha, mas por sorte estava uma manhã linda e isso a encorajou. Sabia que todos aqueles monstros horríveis que ela tanto temia estavam dormindo, pois tinham hábitos noturnos. Já os animais de grande porte geralmente preferiam circular bem longe dali, pois segundo Kolt, eles encaravam a casa na árvore com todos aqueles bonecos de madeira pendurados nos galhos como um monstro gigante que deveria ser evitado a qualquer custo. Provavelmente os únicos que se arriscariam a andar pelas redondezas eram os pássaros e os pequenos roedores, criaturas bem ágeis na hora da fuga. Se Dana iria sair de casa sozinha, aquele era o momento mais apropriado.
_Tu não importas de ficar sozinho só um pouco, não é? Irei em busca das ervas e não me demoro!
_Não precisas..._disse enquanto tentava se levantar. _...já estou bem...sou forte, Dana!
A doce menina colocou a mão sobre seu peito e o fez deitar novamente.
_Descansas, Kolt! _disse. _Deixas que eu cuide de ti!
_Não gosto de ficar aqui deitado!! Essa cama é o lugar mais chato do mundo!! Preciso sair daqui para fazer muitas coisas!!
Kolt podia estar doente, mas mesmo assim seu instinto aventureiro parecia gritar mais alto do que qualquer mal. Se Dana dissesse ou apenas insinuasse que ele não estava em boas condições para isso seria o mesmo que manda-lo derrotar todos os monstros de toda Terra de Alhetra. O garoto detestava ser chamado de fraco, mas Dana sabia como persuadi-lo:
_Não deves sair hoje, irmão!
_E por que não?
_Não percebes? _disse de uma maneira bem convincente. _Tu estiveste derrotando os monstros da ilha a vários meses! Em pouco tempo já não haverá nenhum para duelar contigo, Kolt! Deves parar um pouco ou todos eles morrerão! Tu és forte demais!!
O menino pareceu surpreendido com o ponto de vista da irmã. Ele esperava que ela exaltasse o seu momento de fraqueza, mas Dana fez exatamente o contrário.
_Mesmo? Não tinha reparado nisso, Dana.
_Ouças o que digo! E como serás mais tarde? Com quem irás duelar? Comigo é que não!
Kolt acabou concordando, afinal nenhum monstro era páreo para ele. Tinha de dar uma folga para eles ou poderiam entrar em extinção. Eles tinham sorte de Kolt estar doente naquela manhã, mas quando ele ficasse bom...
_Tens razão! _disse Kolt, todo orgulhoso da sua "terrível força". _Que eles descansem por hoje!
_Que bom que entendeste!
Então, Dana beijou a testa do irmão e levantou-se certa de que sua psicologia reversa funcionara mais uma vez. Kolt era muito vivo, no entanto subestimava um pouco a sua irmã e justamente por isso que ela as vezes conseguia facilmente persuadi-lo. Sua tática só falhava quando ele, ansioso em fazer aquilo que lhe desse na telha, deixava de escutar as suas advertências. Por sorte, naquele dia Kolt era só atenção para com Dana e vice-versa.
Vendo que ele já desistira de se levantar, a menina despediu-se e desceu pelas escadas de madeira da casa da árvore. Levava consigo um cesto de palha feito por ela mesma e uma espada de bambu. Planejava colher ervas medicinais, frutas, e algumas flores que ela adorava. A espada serviria unicamente para derrubar as frutas dos galhos mais altos, pois Dana só pensaria em sair correndo caso alguém lhe atacasse.
De fora da casa a manhã parecia ainda mais linda. O Sol brilhava gloriosamente e sua luz filtrada pelas folhagens das árvores formava feixes dourados que encantaram a menina. Quando vistas de dentro da casa a grama e as rosas não tinham tanta vida como Dana comprovara de perto. O ar parecia ainda mais fresco e sua pele deliciava-se com o calor do Sol. Ali os pássaros cantavam mais alto e voavam em todas as direções, confundindo seus olhares. Uma leve brisa balançou seus longos cabelos dando-lhe um certo prazer, tranqüilidade e confiança para seguir em frente. Eram coisas ela que não costumava sentir, já que mal saia de casa. Mas lá fora sentia uma pequena vontade de explorar a ilha brotar dentro de si. Porém, aquele momento não era o mais apropriado para isso já que precisava cuidar de Kolt.
Não foi necessário caminhar muito. Próximo da sua casa existiam algumas macieiras, laranjeiras e amoreiras. Com a espada derrubava as frutas dos galhos mais altos, guardando algumas no cesto e comendo outras. Sempre pegando as boas frutas e jogando as estragadas fora. Aproveitou para escorar-se na árvore o observar o lago a sua frente e notou que refletia com perfeição o céu, as copas da árvores e a sua própria casa. Naquele momento ela descobria como a simplicidade da natureza era bela e que provavelmente Kolt jamais parou para observa-la daquela forma, com exceção da terceira lua. Mas cada vez que o irmão lhe vinha a cabeça, Dana “acordava” e voltava suas atenções para suas tarefas. Por ali ficou até sentir-se satisfeita.
_Pobre Kolt! _pensou. _Já estas doente! Imagina se comer um fruto estragado!
Poucos passos a frente Dana avistou junto a algumas rochas enormes as tais ervas que tanto precisava. Seria trabalhoso colhe-las, pois a planta era cheia de espinhos. Além disso, era necessário evitar as ervas de menos idade, que ao contrário das mais velhas, eram letais. Uma erva velha poderia curar Kolt em algumas horas, mas uma erva nova poderia mata-lo em minutos. Mas Dana era uma especialista em ervas medicinais e jamais cometeria um erro tão crucial, embora não soubesse explicar o porquê dessa característica tão peculiar. Imaginava que, com o passar do tempo, o veneno contido nas ervas mais novas sofria uma transformação, resultando em uma substância com um alto poder de cura. Se estudasse bioquímica certamente poderia explicar esse fenômeno, mas naquela época a maioria da população mundial era quase analfabeta e somente poucos privilegiados tinham a oportunidade de estudar. Além disso os conhecimentos químicos da época era quase ou totalmente nulos, o que de certa forma colocava a menina numa posição admirável, embora conhecesse somente os fins e não os meios.
Enfim... após colher as ervas de que precisava, Dana ficou com os braços bem arranhados. Isso era algo que não costumava acontecer e naturalmente o sofrimento era enorme para uma menina tão frágil. Mas era um sacrifício que fazia com todo o prazer, já que a saúde de Kolt dependia disso. Ela costumava ser medrosa, mas era persistente quando preciso!
Depois de garantir a primeira refeição e a cura do irmão, Dana percebeu que ainda tinha tempo de sobra para cuidar de coisas mais pessoais. Como por exemplo, o enorme desejo que sentia em colher umas certas rosas brancas que ficavam do outro lado do lago. Sempre que esperava que Kolt retornasse de suas caçadas, Dana costumava observa-las da casa na árvore. Desde aqueles tempos sonhava em colhe-las, mas o medo de ser atacada pelos monstros a impedia sempre. Mas aquele era o dia perfeito...
Dana foi em direção as rosas e para isso foi necessário dar a volta no lago. Ela não sabia nadar e a travessia foi lenta porque não quis rodear o lago de perto, mesmo sabendo que a água batia somente nos seus joelhos. Ali Kolt lavava-se todas as madrugadas enquanto Dana preferia banhar-se em outro lago mais raso ainda. Mas para seu irmão, um exímio nadador, qualquer um dos lagos da ilha não eram nada mais do que poças de lama extremamente tediosas. Ele tinha sim uma intimidade toda especial com o mar e Dana já até ouvira de sua boca muitos planos para buscar o continente. Mas para isso seria necessário atravessar o Mar do Dragão e até que ela arrumasse coragem para tal ele ainda teria de esperar muitos anos.
Ao chegar finalmente, seus olhos brilharam de emoção:
_Que lindas! São ainda mais maravilhosas de perto!
Sem demora colheu as rosas enquanto pensava no vaso de barro que tinha feito a alguns dias atrás. As colocou carinhosamente no cesto com raízes e tudo. Ao chegar em casa, iria enche-lo d’água e coloca-lo ao lado de sua cama junto com as rosas.
_Tenho que pega-las com carinho! Se eu tivesse pedido ao Kolt ,para pega-las, com certeza teria machucado todas elas! Eu sou como essas rosas enquanto ele é rude como as ervas medicinais!
Ao término de suas tarefas Dana nem andara muito. Do outro lado do lago podia-se avistar os bonecos de madeira que Kolt vivia espancando. Só faltava preparar o chá medicinal e o vaso de flores.
Mas quando preparava-se para voltar para casa a menina sentiu cócegas nos seus pés, como se algo lambesse suas pernas. Dana olhou para baixo e viu a criatura, um coelho dourado.
Dana sempre quis ter um animalzinho. Ela odiava os animais grandes e assustadores, mas amava os pequenos mamíferos, principalmente coelhos. A menina não pensou duas vezes em tentar pega-lo. Mas ao ver que seria capturado, o coelho disparou para dentro da floresta. E Dana, que esqueceu-se completamente do medo que sentia da floresta, fez o máximo para não perde-lo de vista. Correu atrás do pequeno animal por entre dezenas e dezenas de árvores enquanto ele a driblava, passando diversas vezes pelas pernas da menina. Dana bem que fez um esforço digno, mas o coelho acabou desaparecendo entre alguns arbustos com a sua agilidade. Procurou remexe-los, mas sem obter um bom resultado. Decepcionada, não teve escolha a não ser dar meia volta e ir cuidar de seu irmão. No fundo tinha esperanças de encontra-lo num outro dia.
Porém, ao observar melhor as redondezas, a menina viu um monumento cilíndrico semelhante a um pilar. Estava de pé como as árvores da floresta. Dana aproximou-se com um olhar curioso e ficou diante dele por alguns segundos. Parecia-se bastante com as construções que existiam nos grandes continentes. Isto chamou a sua atenção, pois Kolt jamais lhe contara que existiam construções daquele tipo na ilha. As aparências diziam o contrário, parecia estar ali a séculos. Mesmo assim achava que aquele monumento não era originário dali. Aproximou-se mais ainda para examina-lo melhor.
_Um pilar no meio da floresta...parece que tem algo escrito nele...hum...símbolos...não tenho idéia do que significam..._e apalpou o monumento. _Não és de pedra...nem de madeira e nem de barro...Serás de metal? Hum...não...acho que não...Quê serás?
O monumento era grosso como uma árvore média, tinha por volta de dois metros de altura e estava repleto de inscrições misteriosas. Foram cuidadosamente esculpidas, mas isso não ajudava em nada na solução de enigma. Parecia estar bem fixo na terra, como se uma grande parte de sua extensão estivesse enterrada. Dana o examinou por um bom tempo, dando muitas voltas ao seu redor, apalpando toda a sua extensão e esforçando-se o máximo para desvendar o que aquelas inscrições desconhecidas diziam. Mas por mais que pensasse, não conseguia chegar a nenhuma conclusão. Diante do pilar, Dana o observou por mais alguns segundos, chegando até a esquecer-se do resto do mundo que a cercava.
_Isso não faz sentido! _dizia em pensamento. _Ninguém mais vive nessa ilha além de mim e de Kolt! Nenhum monstro seria capaz de construir algo tão raro de se imaginar! Ninguém nessa ilha poderia...A menos que esse monumento já estiveste aqui a muito tempo, bem antes de nós!
Por fim, Dana percebeu que de nada adiantava ficar ali matutando. Ela era uma menina de muitas obrigações e não deveria perder mais tempo com aquele pilar misterioso. O seu dever naquele momento era cuidar de suas tarefas e providenciar um ótimo lugar para colocar suas rosas brancas. Não foi possível para ela capturar o coelho dourado, mas talvez seu irmão fizesse isso depois que se curasse da indigestão. Era o mínimo que ele poderia fazer por ela depois dos inúmeros perigos que Dana enfrentara naquela manhã.
Voltou para casa onde Kolt encontrava-se dormindo profundamente em sua cama. Provavelmente ficara tão entediado que acabara pegando no sono, algo muito raro de se ver. Decidiu não acorda-lo. Quanto mais tempo passasse dentro de casa melhor. Depois de por as rosas no vaso de barro e de preparar o remédio, só restava cuidar dos serviços domésticos. No final da tarde quando Kolt despertou, Dana já fizera todas as suas tarefas e pode lhe oferecer uma refeição baseado em frutas, legumes e chá. Nada de carne de monstro dessa vez! Kolt adorou, repetindo-a várias vezes e deixando a irmã radiante.
_Tu és um anjo, Dana! _disse Kolt após terminar a refeição. _Eu não seria nada sem ti.
A menina baixou a cabeça e procurou esconder com as mãos suas bochechas que, embora não conseguisse vê-las, sabia que iriam mudar de tonalidade. A timidez também era uma das suas características mais marcantes.
_Não fales assim...
_Dana! Ficaste vermelha! _observou o menino, enquanto preparava-se para tomar a poção. Ao contrário do que esperava, tinha um gosto muito bom.
_Só faço as minhas tarefas...nada mais!
Kolt a olhou com ternura e reparou nos arranhões que cobriam os seus braços. Dana os jogou para trás, escondendo-os nas costas para que o menino não se sentisse culpado por seus machucados. Em seguida, Kolt baixou a cabeça, ficando pensativo de repente. Dana sentiu uma certa tristeza em seus olhos e ficou preocupada:
_Quê tens? Minha comida te fizeste mal?
_Não...estavas deliciosa! Eu só estava pensando no futuro...
_Futuro?
_Sim! No que serás de nossas vidas...
_Como assim? _Perguntou a menina. _Me digas quê te afliges, Kolt!
_...estava pensando em sair da ilha.
_Mas por que?
_Estou cansado daqui, Dana! Quero sair daqui e migrar para o Reino Sagrado de Hurânia!
Dana já sabia sobre o sonho do irmão. Ele não precisara dizer muitas coisas, bastava notar no quanto seus olhos brilhavam todas as vezes que falava em ser um cavaleiro de Hurânia. Todos os meninos daquela época sonhavam em ser o guerreiro mais forte de toda Terra de Alhetra e os cavaleiros de Hurânia estavam entre esses guerreiros. Kolt queria sair daquela floresta que não lhe oferecia mais desafios e ampliar seus horizontes como “homem”. A Terra de Alhetra era grande demais para que ele ficasse o resto de sua vida naquele lugar isolado de tudo. Ele já não se lembrava de quase nada sobre seu passado, mas sabia que poderia construir um grande futuro longe dali. Sabendo disso, Dana sentou-se ao seu lado e olhou bem dentro de seus olhos dizendo:
_Se tu queres sair da ilha, então irei contigo! Estarei sempre do teu lado, não importas onde estejas! Lembras do que sempre te digo? Tu és tudo o que eu tenho, Kolt! Jamais ficarei contra ti, meu irmão!
_Então aceitas atravessar o oceano apenas para realizarmos o meu sonho, Dana? Serás muito arriscado! Não estas com medo de morrer?
_Kolt...não posso esconder o meu medo! _admitiu a menina enquanto tirava a sua temperatura mais uma vez. _Mas os teus sonhos são os meus sonhos. Vou contigo até onde quiseres por toda a eternidade!
Comovido, Kolt a abraçou e assim permaneceram por muito tempo. Cada dia que se passava, sempre descobriam o quanto eram importantes um para o outro.
_Estas dizendo a verdade? Não disseste isso apenas porque estou triste? Ou serás porque estou doente?
_Sabe que não minto! Mas se tu precisas de um motivo para que eu tenha aceitado, então eu lhe digo que tu és muito cabeça dura e não deves andar pela Terra de Alhetra sozinho. Se eu não for contigo, tu acabarás apanhando de algum dos guerreiros dos grandes continentes, porque tu também és muito brigão!! Vou contigo para que nunca saias do caminho certo e transforme-se num depravado!
Kolt riu e disse:
_As vezes tu és sincera demais, Dana! O pior de tudo é que tu disseste uma verdade e eu não posso te contrariar!
Então ambos caíram na gargalhada. Foi então que Dana se lembrou do monumento misterioso e achou que aquela era o momento certo de se tocar no assunto. Falou sobre as frutas, das ervas, do medo de cair no lago, das flores, do coelho dourado, enfim... tudo minuciosamente narrado como se fosse uma grande aventura, parecendo uma espécie de odisséia na floresta. A menina chegou a se emocionar em determinados trechos tamanho o exagero. Mas no final de seu relato já estava anoitecendo e ela jamais se atreveria a voltar lá fora para lhe mostrar a estranha construção.
_Um pilar? _perguntou Kolt. Ele conhecia a ilha como a palma da mão. _Tens certeza, irmã? Eu nunca vi monumento algum na ilha...
_Não? Imaginei que soubesses!
Subitamente, levantou-se e foi até a porta.
_Aonde vais? _perguntou Dana.
_Quero ver esse tal monumento! Não saias de casa, Dana! Estas escuro lá fora e a morte é traiçoeira, minha irmã!
_Mas você não..._a menina pensou em pedir que ele voltasse para cama, mas sabia que seria impossível esperar isso dele depois de ouvir aquela estranha história. Dessa vez Dana não encontrou nenhuma forma de usar a sua psicologia reversa, então só lhe restaria rezar para a Deusa Alhetra que seu irmão regressasse logo. Pelo menos a poção que ela fizera o curou rapidamente. _Bem...ficarei te esperando, irmão! Tu buscarias um coelho dourado para mim?
_Dourado? Eu tentarei, mas não prometo trazer ele hoje...
Kolt saltou da casa da árvore sem sequer tocar na escada e correu até onde Dana afirmou ter visto o pilar. Poucos minutos mais tarde já o havia encontrado e passou a examina-lo. Suas conclusões não foram diferentes das de sua irmã, mas havia algo em particular que chamou sua atenção, um símbolo que ele já conhecia bem: o emblema do Reino Sagrado de Hurânia.
_Que estranho..._refletia. _..o Reino Sagrado de Hurânia ficas muito longe daqui. Sei que já caminhei muito por esses lados, mas nunca vi este monumento antes...Mas quê és isso?
O emblema do Reino Sagrado de Hurânia era constituído de quatro triângulos cercados de laços dourados. Poucos sabiam o significado dos triângulos, mas todos sabiam que os laços simbolizavam o poder e o controle que o reino exercia sobre o mundo. De todos os grandes continentes, apenas dois eram propriedades de outros reinos menores e de pouca importância. Mas para um reino que ditava as regras do mundo essas ilhotas repletas de monstros e selvagens eram quase insignificantes. Certamente a ilha de Kolt não fugia á essa regra e isso significava que encontrar qualquer vestígio da cultura hurâniana nesses “fins de mundo” era impossível. Só que Kolt estava diante de um desses vestígios, o que complicava ainda mais o enigma.
Tentou remover o pilar, mas todo seu esforço foi em vão. Nem mesmo ele, que era tão forte, conseguiu mover sequer um milímetro. Kolt tinha um gênio bem diferente de Dana e, mesmo tratando-se de um vestígio da cultura hurâniana, ele não estava muito disposto a ficar ali deduzindo sobre o monumento. Na verdade a noite já estava caindo e ele só conseguia pensar em um modo de ver a terceira lua. Por fim, o menino decidiu simplesmente ignorá-lo, pois no final das contas aquele monumento não significava nada para ele. Era apenas um pilar, uma construção sem vida e inofensiva. Sua presença já não lhe causava nenhuma reação.
Antes de ir embora o menino olhou para o céu na esperança de ver a Carolina...
_As luas..._observou. _...elas estão se juntando mais uma vez...Dana deve estar assustada! Ela terá de esperar até amanhã para ganhar o seu coelho cor de ouro.
O menino então correu até sua casa para confortar Dana que também detestava certos fenômenos naturais como eclipses e o alinhamento mensal das três luas. Certamente ela já estaria enfiada no meio da cama de palha tentando não ver o fenômeno. Depois de tudo que ela fizera por ele, Kolt não poderia deixar de conforta-la naquele “momento difícil”. O menino correu o mais depressa possível para casa, até porque ele poderia observar o alinhamento de lá mesmo. Porém, ao chegar notou a ausência da irmã, que não estava na cama como ele esperava. Procurou por todos os lados da casa e não a encontrou. Pôs a cara fora da janela e gritou seu nome bem alto, mas não obteve resposta. Dana não estava em lugar algum.
_Dana!!! Onde estas???? Dana!!!!
Dana não teria saído, pois Kolt mandou que ela o esperasse dentro de casa. Ela jamais sairia a noite por temer os monstros...os monstros! Teriam os monstros feito algo com ela? No entanto Kolt não encontrou sinais de violência ou tampouco escutou algo. O menino ficou desesperado, Dana era a coisa mais importante na sua vida. Jamais se perdoaria se ela morresse por culpa de suas andanças noturnas. Procurou concentrar-se em seus cinco sentidos, mas nenhum deles lhe indicava uma pista como se ela jamais estivesse ali antes. O menino olhou novamente a cama e avistou o último vestígio da menina, o vaso de rosas brancas que pareciam simbolizar a sua preocupação. Pegou uma rosa e a segurou firmemente contra o peito como se lhe fizesse um pedido. Mas a rosa não seria capaz de ajuda-lo naquele momento, então ele a devolveu ao vaso decidiu olhar lá fora. Sem um rastro a seguir o menino sentiu-se incapacitado e a mercer da complicada situação. Da janela Kolt observou o alinhamento das três luas e se pôs a chorar. A doce menina que cuidou dele durante todo o dia desaparecera! Sem ela, sua vida não significava nada...
Para Kolt só restava rezar a Deusa Alhetra para trazer sua querida irmã de volta. Seus instintos, nos quais tanto confiava, agora pareciam dormir em um sono profundo. O menino não sabia que atitude tomar, procurava acalmar-se, mas tudo era em vão. Cada segundo não era nada além do que um passo a mais para cair em desespero.
Foi então que a lenda começou. Foi quando Kolt olhou em direção ao lago e viu algo que chamou a sua atenção. Do outro lado avistou um estranho brilho dourado que sugeria algo bem maior que um incêndio. Um brilho que lhe mostrou visões de outros povos, outras culturas, outros mundos e outras eras Cenas que percorreram sua mente na velocidade da luz e desafiaram sua compreensão de mortal. Por alguns instantes ele deixou de pensar em Dana para concentrar-se naquele acontecimento isolado. Sua viajem mental demorou poucos milésimos, mas foi o suficiente para percorrer todos os períodos do tempo que se armazenaram em um canto escondido de sua memória quando recobrou a consciência. Então retornou a sua época, quando avistara a estranha luz vindo do outro lado do lago. Lembrou-se que o monumento ao qual observou a poucos instantes atrás ficava exatamente naquela direção. Tratava-se do monumento misterioso que emanava uma luz que crescia cada vez mais...
_Que luz é essa? _pensou confuso. _Por Alhetra, quê estas havendo aqui?
...e o pequeno brilho se transformou instantaneamente em um clarão tão intenso que fez com que a noite virasse dia, pegando-o de surpresa. O impacto o jogou no solo com a face virada para o céu. No meio da explosão ele teve a impressão de ter visto uma menina de cabelos vermelhos e um rapaz loiro caírem das nuvens, mas depois Kolt já não conseguiu mais abrir os olhos diante do imenso clarão. Tentou proteger os olhos com as mãos, pois aquela luz atravessava facilmente as suas pálpebras e parecia queimar suas retinas. Imobilizado, paralisado, sem ação. Não sabia quê estava acontecendo. Só conseguia pensar em Dana...só queria que tudo aquilo acabasse...
E a luz do monumento iluminou toda a Era Medieval(1000d.m.) para muda-la para sempre...

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